UM CONTO INFANTIL CINCO


DONA FU

Dona Fu vivia num grande descampado, onde era possível apreciar o horizonte por todos os lados para onde se olhava, até onde a vista alcançava. Era uma vista infinita, quase que a limitar a própria existência da Dona Fu, uma vez que a mesma nem sequer conseguia ter a dimensão de seu tamanho. Era um campo verde musgo, de uma textura bastante macia e aveludada. Quase não tinha cheiro de natureza, nem de musgo, o que fazia Dona Fu pensar que talvez todo aquele descampado fosse artificial. Mas, apesar de tudo, a nossa ilustre personagem se contentava com aquela sua vidinha. Dona Fu vivia naquela região há bastante tempo, embora não soubesse calcular com exata precisão quantos anos ou dias ou minutos era habitante singular e solitária daquele inusitado sítio. O fato é que Dona Fu não tinha lembrança de ter residido em outro lugar, nem semelhante nem diferente daquele no qual se encontrava. Pensava em várias possibilidades: que tinha nascido ali e, por alguma razão que não sabe explicar, a sua família, pai, mãe e eventuais irmãos teriam desaparecido. Ou então que ela teria caído do céu, a exemplo das estrelas cadentes, com a diferença que a nossa estrelinha teria perdido a memória ao acordar naquela imensidão verde. Mas Dona Fu, como já se disse, habitava sozinha toda aquela vasta ‘verdidão’. Não tinha nada para fazer, ou com quem brincar, falar ou trocar impressões sobre o horizonte, que muitas vezes parecia pálido, qual uma parede branca. Chegou um dia que Dona Fu, não se contentando em ficar ali parada, olhando para aquela imensidão que se perdia de seus olhos, resolveu caminhar. Caminhou por muito tempo, mas não encontrou mudança alguma. Apesar de sua frustração, continuou andando e andando e andando, até a infinidade verde e pouca esperançosa. Quando estava quase a desistir, não sabendo tampouco o que faria dali a diante, se deparou, a contra-senso de tudo que poderia imaginar naquele momento e naquela situação, um paredão, também verde, que devia ter milhões de metros de altura. Dona Fu ficou ainda mais confusa. Era certo que um descampado verde não poderia ter fim. Mas também não era possível que acabasse num muro verde mais alto que todos os prédios do mundo empilhados. Pronta a investigar aquela despropositada divisória, resolveu caminhar por toda a extensão da mesma, já que subi-la não poderia, por motivos óbvios: tinha medo de altura. Dona Fu, então, começou a caminhar novamente, tendo aquela enorme parede verde do seu lado direito. Caminhou até não poder mais de tão cansada. Parou por alguns segundos para tomar um ar e retomou aquela que poderia chamar de caminhada para a felicidade. Tinha, a qualquer custo, que descobrir a razão daquilo tudo. Caminhou mais um pouco, até que finalmente viu algo de novo naquela paisagem. Tratava-se de uma esquina onde a parede terminava, mas continuava para um outro lado, dantes inexplorado. O mais curioso é que entre as duas paredes que se localizavam exatamente na perpendicular de uma a outra, havia um buraco enorme, gigantesco. Dona Fu teve medo de aproximar-se daquele, digamos, furo no chão. Passou longe dele e seguiu caminho rente à outra parede verde, de maneira que ela continuava do seu lado direito. Não precisou andar muito – fique claro que a nossa cansada personagem teve que andar muito, sim. Mas, em comparação com a caminhada que tinha percorrido anteriormente, essa era bem mais reduzida – para Dona Fu chegar exatamente no mesmo lugar. Aquela esquina de muros verdes extremamente altos com um buraco entre eles. Mas não era possível, pensou consigo mesma, que fosse o mesmo lugar. Deveria ser miragem. Desta vez, resolveu investigar também o buraco que emergia à sua frente, qual um buraco negro pronto a sugar qualquer corpo que apareça diante de si. Chegou bem na beirada e pôde avistar, lá embaixo, algumas tranças que pareciam uma rede. Estranho. Era um buraco que devia ter sido feito para aparar algum objeto tão gigantesco que Dona Fu não conseguia imaginar. Mais embaixo ainda, muito além da distância entre o chão e a rede, havia uma outra plataforma. Não era uma plataforma verde. Como era muito longe, Dona Fu não conseguia enxergar direito. Mas parecia de um marrom acarpetado. A nossa cansada, irritada e deslumbrada personagem quase entrou em choque. Não conseguia entender onde estava e nem o que representava todo aquele cenário que se apresentava diante de si. Voltou para onde considerava seguro para não cair no buraco e resolveu tirar um cochilo. Realmente estava muito exausta. O cochilo deve ter durado uma eternidade, pois acordou bem disposta a continuar a sua jornada. Pôs-se a caminhar novamente, feliz e pronta a descobrir boas novas quando ouviu um barulho muito estranho, quase ensurdecedor, vindo de um ponto que não conseguia ver. Cada vez mais o barulho ia ficando mais e mais alto, até que, de repente, Dona Fu se deparou com uma bola de tamanho imensurável e de cor vermelha vindo em sua direção a uma velocidade que não se pode descrever. Foi o tempo de Dona Fu dar um pulo para o lado para que a bola não passasse por cima de si e a esmagasse qual uma formiga indefesa, sem saber o que fazer, na superfície de uma mesa de bilhar. Porém, a sorte de Dona Fu finalmente chegou ao fim. Tão logo conseguiu desviar da bola vermelha, não reparou que foi cair bem no local por onde estava vindo uma bola branca, maior ainda, e numa velocidade não menos ligeira. Não é preciso dizer que Dona Fu foi esmagada, esmigalhada, destroçada, triturada, fragmentada, estilhaçada, esfarelada em mil pedacinhos. Coitada!

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