ASSASSINATO DO ANÃO, DE PLÍNIO MARCOS - UMA CRÍTICA

A radicalidade imanente do texto de Plínio Marcos, a força de suas relações entre as personas complexas, as potenciais e inúmeras camadas a serem exploradas, viabiliza, por um lado, um campo exploratório infindável de multi tentaculares possibilidades frente ao texto.Todavia, por outro lado, ainda que pese, na maioria dos casos, uma tendência de superação [embora aqui se trate de outra coisa] das dificuldades resultantes deste confronto com a dramaturgia de Plínio Marcos, seria muito arriscado negligenciar todas estas possibilidades, quer sob o ponto de vista da pesquisa, quer sob a visão concepcional da questão.
Há, contudo, ainda que se coloque em xeque, uma tentativa de superar as dificuldades, suplantando-as por uma via pré-programada de defesa, mas com alegria e verdade, na maioria das vezes.
A esse respeito, vale lembrar do risco que se corre ao encenar um texto de Plínio Marcos, no caso o “Assassinato do anão do caralho grande”. Trata-se de um texto que exige muita maturidade. Maturidade para compreensão do que se diz, para reflexão e análise profunda das várias camadas que o texto atinge. Não obstante, é possível vislumbrar apontamentos muito interessantes, tais como figuras extremamente delineadas, outras tantas configurações corais bastante consistentes, ou ainda algumas conexões entre atores bem fortes. Porém, repito, tudo isso está rarefeito de seu sentido, pois não se o encontrou. É necessário aprofundar nas camadas de compreensão do texto. Não se pode dizer interessante, nos dias de hoje, uma cortina que é apenas uma cortina ou um carretel de madeira gigante que é apenas um carretel de madeira gigante.
Por fim, gostaria de deixar aqui registrado que os atores da turma 60 da EAD são uns lindinhos. Adoro eles todos!

Seu Molina!
(espetáculo da turma 60 da Escola de Arte Dramática - julho de 2010)

ENSAIO SOBRE A SURPRESA!

ENSAIO SOBRE A SURPRESA

Imagine você sentado num dos oitocentos lugares do Teatro Municipal, assistindo a uma ópera lindíssima, vinda diretamente da companhia sinfônica dos Países Baixos, sob a regência de um maestro norte americano, ao som de Wolfgang Amadeus Mozart. Agora imagine que, apesar de o ingresso custar de trezentos a quinhentos reais, você não pagou nada porque o seu vizinho do andar de baixo ganhou na promoção da rádio cultura mas não ia usar e lhe ofereceu e você pensou “Se custa tão caro, deve ser bom. Se estou pagando nada, porque não?” Ainda que muitos não admitam, esse raciocínio é bastante corriqueiro. Ora, quem nunca ouviu aquela expressão que de tão usual quase já se tornou um jargão popular, no qual se diz que de graça até injeção na testa? O fato é que o empreendimento da cortesia é bastante difundido entre aqueles que, por uma razão ou outra, gostam de um entretenimento gratuito, mesmo que não saibam do que se trata. E, assim, voltamos ao rumo inicial do ensaio, que diz respeito a surpresa em si. Imagine, então, que você está lá sentado numa das poltronas do Teatro Municipal e a ópera já começou e você está achando um pouco chato. O movimento da sinfonia praticamente te embala para um sono bem gostoso. Mas você resiste. Afinal, você está no Teatro Municipal, no meio de pessoas potencialmente importantes e endinheiradas, que supostamente pagaram de trezentos a quinhentos reais no ingresso (não levemos em conta o fato de que essa sessão é exclusiva para assinantes do jornal e ouvintes da rádio que ganharam os ingressos). Você está sentindo certa importância no meio daquelas pessoas bem vestidas. Vestiu sua melhor camisa combinando com a sua melhor calça, calçou o seu melhor sapato com a sua melhor meia e a melhor cueca e assim por diante. Os violinos, acompanhados pelos violoncelos e contrabaixos, entoam uma melodia bastante inebriante. A percussão suave dá ao sonoro movimento uma sensação de batimentos cardíacos bastante desacelerados. Ao fundo, uma soprano entoa uma nota aguda em ré sustenido, que mais parece um apito do trem bem distante. Aquele apito que se confunde com algum som do inconsciente, que te leva diretamente para um sono profundo. E de repente, você descobre que está dormindo, afundado na cadeira semi confortável do teatro municipal, com o pescoço pendendo para o lado esquerdo, quase babando. E se estivesse acordado, você descobriria que os outros setecentos e tantos espectadores encontram-se na mesma situação, de sono profundo. Ao som da música suave e embalante, você vai longe nos sonhos mais esquisitos. Você está na corte de Luis XV, ao lado de nobres com perucas brancas e perfume francês. Quem está regendo a orquestra é ninguém menos que Mozart. O sr. Stradivarius comanda o côro de violinos e a madame Callas canta lindamente o seu mais agudo tom. De repente, BLANBLAN, um rompante de som estrepitante com o auxílio da percussão invade a sala e você acorda de seu sonho esquisito. As pessoas na platéia do Teatro Municipal olham umas para as outras, tentando disfarçar o recente susto, limpando a baba do canto da boca, massageando o pescoço e se ajeitando na cadeira. Um susto musical. Uma contradição sonora. Um paradoxo melódico e percussivo. Uma surpresa sinfônica. Sabia, aliás, que esse recurso era bastante utilizado para manter os nobres da corte acordados nas apresentações de ópera e música clássica? No teatro é a mesma coisa. Muitas vezes o espectador dorme na platéia e então é preciso que algo aconteça para que ele acorde. Um grito da atriz ou um cutucão da namorada ou o barulho da pipoca sendo mastigada ou o telefone celular tocando no seu bolso. Tudo isso não passa de uma grande surpresa.

NADA EM VÃO SÃO AS PALAVRAS BEM DITAS – CRÍTICA AO ESPETÁCULO EM VÃO, NO VÃO OU VÃO DE IR MESMO

NADA EM VÃO SÃO AS PALAVRAS BEM DITAS – CRÍTICA AO ESPETÁCULO EM VÃO, NO VÃO OU VÃO DE IR MESMO
Eporbemditasentendassebemditassejamtodasaspalavrasquedisseremasmeninasdogrupobemditosejaamarcellaeatathysobadireçãodamonicamontenegro.
Alguém já parou para imaginar a força que a palavra tem? E quando Deus criou o mundo com a força da palavra, quem duvidou da força que a palavra tinha? Pode-se dizer que a palavra tem o poder presentificador, transformador, enternecedor, etc... As camadas expressivas das palavras... aí está o ponto crucial do exercício / espetáculo das meninas. Imagens criadas pela palavra, onde cenários e roupas brancas e chuvas de palavras caídas do céu e uma gangorra são meros coadjuvantes da potencialidade que a palavra tem. A palavra que ganha contorno, forma embelezadora diante da técnica excessivamente apurada do trabalho da Mônica, excessivamente realizado pela tathy e pela marcella, aquelas duas belezinhas, delícias de se ver e se ouvir. Às vezes, é bom fechar os ouvidos e embarcar nas imagens criadas pelas palavras que, fazendo juz à ambição do grupo, são muito bem ditas. Até demais. Em alguns momentos, talvez a técnica do bem dizer ganha mais importância que as próprias imagens que os textos sugerem. Visto de um ponto de vista experimental, torna-se bastante interessante o modo como as meninas conduzem a palavra desde o seu diafragma, reverberando pela coluna, dando voltas pelas escápulas, mandíbulas, têmporas, fazendo um bate e volta na testa e saindo pela garganta de forma natural e bela. Contudo, em que pese a necessidade de estabelecer um diálogo coeso com a sua matriz, os movimentos técnicos podem ser deixados de lado, por alguns instantes, para que a beleza e a alegria e o humor dos textos venham à tona. E, mais do que isso, ver como esses textos permeiam as vivências e experiências das meninas, de modo a transformá-las, aí sim, será transformador e o público será transformado com as bem ditas palavras.