USP, NOVE DE JUNHO DE DOIS MIL E NOVE – UM ENSAIO SOBRE O CONCEITO DA ESTÁTUA VIVA
(Referência ao triste episódio ocorrido entre membros da comunidade universitária e a força tática da Polícia Militar do Estado de São Paulo)

Se a estátua não se move, a estátua viva, por sua vez, é viva em seu não movimento.
Se imaginarmos uma estátua viva no parque do Ibirapuera, numa tarde de domingo, tirante o fato do chapéu passado, teremos um exemplo perfeitamente hipotético daquilo que se toma como premissa básica do próprio conceito da estátua viva.
Para o domingueiro a passeio no parque, a estátua é imóvel. Porém, se adentrarmos as células e músculos e ossos e sangue e veias e artérias e órgãos e olhos e pulso e ritmo da estátua, veremos que ela está mais viva do que nunca. Um anseio e desejo e necessidade de se fazer notar perante a apatia semântica do funcionário público com seu cachorro, da doméstica e o cobrador de ônibus que levam seus filhos para fazer um piquenique no parque, do juiz de direito que pratica Cooper numa bela tarde ensolarada de domingo de quase inverno.
Tudo isso para trazer à metafórica revelação o episódio dos estudantes da Universidade de São Paulo, e seus funcionários, e seus professores. Transbordamento de vísceras surpreendentes, vibrantes e tonificantes.
A Força Tática da Polícia Militar transfere ao âmbito institucional a responsabilidade de infringir as leis constitucionais de garantias fundamentais dos direitos humanos.
A USP virou praça de guerra. Os escudos e capacetes blindados cuspiam fumaças derivadas das famosas bombas de efeito moral e gás de pimenta malagueta, a mais forte.
O prédio da faculdade de letras e filosofia virou câmara de gás. Não foi bolinho não.
São níveis diferentes de envolvimento cultural, numa explícita, mas deslocada citação aos irmãos Presniakov, em ‘No papel da vítima’.
Como se a reitoria e o governo do Estado e a mídia na sua imensa maioria fossem transeuntes domingueiros que passeiam no parque de domingo de tarde e não enxergam as células e os músculos e as artérias e as idéias e os pulsos e o ritmo e os anseios e os desejos e as necessidades dos estudantes, dos funcionários, dos professores da universidade de São Paulo, que não passam de estátuas vivas aos olhos alheios e indiferentes e desinteressados.
Como manifestação de repúdio absoluto contra a invasão da Polícia Militar no campus da USP, no Butantã, em São Paulo, bem como contra o disparo desenfreado de agressões desconexas contra os estudantes, deixo aqui meu subscrito.
Seu Molina.

Um comentário:

  1. Seu Molina,

    Fiquei impressionada com a metáfora explicitada no texto, tão bem aplicada nesse caso.
    Sem mais palavras, deixo aqui meu registro, como leitora... sua sensibilidade me emociona.
    Beijos imensos.

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